sexta-feira, 1 de maio de 2009

Poema do coração


Eu queria que o Amor estivesse realmente no coração,
a também a Bondade, e a Sinceridade,
e tudo, e tudo o mais, estivesse realmente no coração.
Então poderia dizer-vos:
"Meus amados irmãos,
falo-vos do coração",
ou então:
"com o coração nas mãos".

Mas o meu coração é como o dos compêndios.
Tem duas válvulas (a tricúspida e a mitral)
e os seus compartimentos (duas aurículas e os ventrículos).

O sangue ao circular contrai-os e distende-os
segundo a obrigação das leis do movimento.

Por vezes acontece
ver-se um homem, sem querer, com os lábios apertados,
e uma lâmina baça e agreste, que endurece,
a luz dos olhos em bisel cortados.
Parece então que o coração estremece.
Mas não.
Sabe-se, e muito bem, com fundamento prático,
que esse vento que sopra e ateia os incêndios,
é coisa do simpático.
Vem tudo nos compêndios.

Então, meninos!
Vamos à lição!
Em quantas partes se divide o coração?

António Gedeão
Maio é o mês do coração e este belo poema fala-nos deste órgão maravilhoso, anatomica e sentimentalmente falando e que nós teimamos frequentemente em maltratar.
António Gedeão era de facto único: aliava a profundidade do conhecimento científico à sensibilidade poética, espelhando a sua vocação pedagógica na mestria das palavras!

1 comentário:

Gabriela Machado disse...

É verdade! A poesia de António Gedeão fala-nos ao coração, mas também aos olhos, ao tacto,etc. ou seja, toca-nos sempre de alguma forma. Para mim é também um poeta de eleição.